Cover: TikTok Short Film Competition Winners Matej Rimanić, Nik Kranjec, Tim Hamilton, Claudia Cochet and Mabuta Motoki at the award ceremony. By Nik Kranjec Creative Commons Attribution-Share Alike 4.0 May 20, 2022
Maurício Pinheiro
Vocês já devem estar sabendo que o TikTok, aquele aplicativo das dancinhas, está sendo banido mundo afora. Talvez queiram saber mais sobre o motivo disso.
“O TikTok é uma das plataformas de mídia social mais populares do mundo, permitindo aos usuários compartilhar vídeos curtos e divertidos. A empresa chinesa ByteDance, responsável pelo aplicativo, se tornou uma das empresas de tecnologia mais valiosas do mundo, graças a seu foco em inteligência artificial e algoritmos avançados. No entanto, a popularidade do TikTok também gerou preocupações em relação à privacidade e segurança dos usuários.
A ByteDance coleta uma grande quantidade de dados dos usuários do TikTok, incluindo informações sobre histórico de navegação na Internet, localização, dados do dispositivo e padrões de uso. Esses dados são usados para alimentar algoritmos de inteligência artificial que poderiam ser usados para fins maliciosos, como o reconhecimento facial e a vigilância em massa. Além disso, esses algoritmos podem ser usados para classificar os usuários em diferentes categorias, como nível socioeconômico, nível curtural e intelectual, orientação sexual, interesses políticos, entre outros.
Essa coleta de dados não é exclusiva do TikTok e é uma prática comum entre outras grandes empresas de tecnologia. No entanto, as preocupações sobre a ByteDance são agravadas pelo fato de a empresa estar sediada na China, onde as práticas de privacidade e liberdade de expressão são muito diferentes dos padrões ocidentais. George Orwell que o diga… Além disso, a Lei de Segurança Nacional da China, que entrou em vigor em 2020, exige que as empresas chinesas tenham a obrigação de fornecer informações ao governo chinês quando solicitado, o que levanta a possibilidade de o governo chinês ter acesso aos dados coletados pelo TikTok. Essa possibilidade alimenta as preocupações de que a ByteDance possa estar coletando informações sensíveis e privadas dos usuários para fins maliciosos, como a vigilância em massa ou a classificação ideológica dos usuários.
É importante destacar que, embora a coleta de dados pelo TikTok possa parecer assustadora, ela é uma prática comum entre outras grandes empresas de tecnologia, como o Facebook e o Google. No entanto, a ByteDance tem sido alvo de uma maior atenção por estar sediada na China e por suas ligações com o governo chinês. Isso levou alguns governos, como os Estados Unidos e a Índia, a banir o aplicativo, citando preocupações com a segurança nacional e a privacidade dos usuários.
Apesar dessas preocupações, a ByteDance afirma que os dados coletados pelo TikTok são usados principalmente para melhorar a experiência do usuário e personalizar o conteúdo recomendado. A empresa também implementou medidas de segurança e privacidade, bem como adicionou uma seção de informações de privacidade para explicar como a empresa coleta e usa os dados dos usuários, como a criptografia de dados e a exclusão automática de dados de usuários inativos. Por fim, a ByteDance estabeleceu centros de transparência para permitir que as autoridades verifiquem como os dados são coletados e usados. Mas será isso tudo suficiente?
Essa preocupação é exacerbada pelo fato de que a Lei de Segurança Nacional da China, que entrou em vigor em 2020, exige que as empresas chinesas cooperem com as agências governamentais em questões de segurança nacional. Isso significa que a ByteDance pode ser forçada a compartilhar dados com as autoridades chinesas, incluindo informações de usuários do TikTok.
A ByteDance tem uma equipe de inteligência artificial altamente qualificada que trabalha no desenvolvimento de tecnologias de reconhecimento de voz, imagem e fala para diversas aplicações, incluindo publicidade direcionada, reconhecimento facial e vigilância em massa. A empresa tem investido pesadamente em inteligência artificial, com o objetivo de criar uma plataforma de inteligência artificial de ponta para oferecer produtos e serviços inovadores. Os dados coletados pelo TikTok alimentam diretamente essas tecnologias de inteligência artificial.
A plataforma usa algoritmos avançados para sugerir vídeos que os usuários possam gostar com base em seus padrões de uso, histórico de navegação e localização. O algoritmo é treinado com dados coletados dos usuários e, quanto mais dados são coletados, mais precisa a sugestão de vídeo se torna. Isso permite que a plataforma ofereça conteúdo altamente personalizado aos usuários, aumentando sua popularidade.
Os riscos de privacidade e segurança dos usuários do TikTok são uma preocupação concreta de governos de vários países ocidentais. Em 2021, o governo indiano baniu o aplicativo, citando preocupações com a segurança cibernética e a privacidade dos dados dos usuários. O governo dos Estados Unidos também proibiu o aplicativo para funcionários do governo, alegando preocupações com a segurança nacional e a privacidade dos dados dos usuários. Em 2021, o governo britânico iniciou uma investigação sobre as práticas de privacidade do TikTok e ele está sendo banido de vários outros países enquanto escrevo este artigo.
Além dos riscos de privacidade e segurança, o TikTok também pode ter efeitos negativos na saúde mental dos usuários. O aplicativo incentiva os usuários a compartilhar conteúdo que possa ser considerado engraçado, engraçado ou “tendência”, e isso pode criar uma pressão social para que os usuários sejam aceitos e sejam populares. Isso pode levar a sentimentos de inadequação e baixa autoestima, especialmente entre adolescentes vulneráveis e inseguros. O TikTok também foi criticado por incentivar a exposição de adolescentes a conteúdo inapropriado, como vídeos sexualmente sugestivos ou violentos. Embora a plataforma tenha implementado medidas para remover esse tipo de conteúdo, os riscos ainda permanecem. Diante desses riscos, é importante que os usuários do TikTok e os pais estejam cientes dessas questões e tomem medidas para garantir que a plataforma seja usada de forma segura e responsável. Isso pode incluir a monitorização do conteúdo visualizado pelos adolescentes, a implementação de limites de tempo para o uso da plataforma e a discussão aberta sobre o uso de dados pessoais e privacidade. Felizmente o Tik Tok avançou nesta direção e criou mecanismos para limitar o conteúdo inapropriado para menores de idade.
E o TikTok não é a única empresa a coletar dados dos usuários. A Didi, mais conhecida como “Uber” chinesa, recentemente adquiriu a empresa de transporte urbano de passageiros no Brasil, conhecida como 99. Outro dia, minha esposa me mandou sua localização pela 99 e recebi um link pelo WhatsApp com o endereço “https://d.didiglobal.com/…”. É provável que a Didi Global esteja coletando tranquilamente dados dos usuários, assim como a Uber e o Waze fazem, para alimentar seus modelos de otimização de rotas, entre outros. Isso é compreensível. No entanto, o que a TikTok faz com os dados coletados ainda é uma incógnita, assim como muitas outras empresas de tecnologia ao redor do mundo e as grandes empresas de tecnologia (Big Techs). Aliás, você sabia que a Didi expulsou a Uber da China? A diferença entre os modelos de negócios destas empresas e os motivos para a Uber não ter dado certo na China serão temas para outro artigo.
No Brasil, temos um problema semelhante que tem sido cada vez mais reconhecido como violação de privacidade generalizada. Recentemente, escrevi sobre novas empresas no mercado imobiliário brasileiro que utilizam algoritmos para coletar dados privados de proprietários, como nome, endereço, telefone, e-mail, entre outros, do ecossistema do Big Data. Essas empresas também extraem dados de imobiliárias que possuem cadastro dos proprietários, relacionando-os com os imóveis que estão à venda. Uma vez identificado o proprietário e o imóvel à venda, esses dados são vendidos para captadores de imóveis (por meio de assinaturas mensais de acesso às ferramentas) que muitas vezes assediam os proprietários e familiares com ligações, SMS e e-mails solicitando o cadastro do imóvel em suas imobiliárias. Isso é uma clara violação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) do Brasil, que protege os proprietários dessas empresas de vendas de dados pessoais e daquelas que se escondem por trás de ferramentas tecnológicas sem transparência. Já existem precedentes legais que concedem ganho de causa aos proprietários com base na LGPD.
Por isso, é importante que os governos e as autoridades reguladoras garantam que as empresas de tecnologia operem dentro de diretrizes éticas e legais. Isso pode incluir a criação de leis e regulamentos mais rigorosos em relação à coleta e uso de dados pessoais, bem como a realização de auditorias regulares para garantir a conformidade com essas regulamentações. No Brasil, temos a LGPD para ajudar nesse processo de proteção de dados. De maneira mais geral, tanto a ByteDance quanto outras empresas de tecnologia deveriam ser mais transparentes sobre suas práticas de coleta e uso de dados. No entanto, como se trata de uma empresa chinesa que venceu uma arena gladitatorial de startups (como descreve Kai-Fu Lee em seu livro AI Superpowers: China, Silicon Valley, and the New World Order de 2018), é compreensível que haja uma diferença cultural na valorização da privacidade. No ocidente, valorizamos nossa privacidade e como usuários acreditamos que temos o direito de saber como nossos dados são coletados e usados. As empresas devem garantir que essas informações sejam facilmente acessíveis e compreensíveis. No entanto, talvez essa perspectiva esteja se tornando cada vez mais uma utopia, especialmente na China, onde o benefício da comunidade é mais valorizado em detrimento da privacidade individual.
Na minha opinião a China está ganhando esta corrida como Aquiles bateu a tartaruga (o ocidente), embora muita gente acredita cegamente que a tartaruga, com sua vantagem, nunca seria alcançada pelo herói. Enquanto Aquiles corre, a tartaruga continua discutindo identitariamente pautas sociais e como ela carrega o mundo nas costas, por enquanto, a preocupação dos ocidentais é sobre qual sexo ela tem (Tery Pratchett que o diga…).
Em resumo, o TikTok e outras plataformas de mídia social oferecem muitas oportunidades e benefícios para os usuários, mas também apresentam riscos significativos para a privacidade e segurança dos usuários. É importante que os usuários e as autoridades reguladoras estejam cientes desses riscos e tomem medidas para garantir que essas plataformas sejam usadas de forma segura e responsável. E lembre-se, como Stuart Russel afirma, de que grande parte da polarização política sem precedentes que vivemos no mundo moderno é causada pelas mídias sociais e seus algoritmos de Clickthrough, que nos colocam em bolhas ideológicas, culturais, comerciais, entre outras.
Ah e vocês querem saber sobre aqueles balões metereológicos e OVNIS sobrevoando o mundo em todos os cantos este ano? Simples… Coleta de dados. Quem tem dados tem poder, pois as IAs já estão por aí e estão famintas por mais dados e de todos os tipos, esta commodity moderna nestes novos tempos que se iniciaram em 2023.
https://techpolicy.press/tiktok-bans-short-sighted-solutions-to-the-wrong-problem/
https://gizmodo.com/tiktok-ban-how-many-countries-bytedance-china-1850238654
https://www.nbcnews.com/tech/tech-news/tiktok-ban-us-biden-explained-rcna75313
https://edition.cnn.com/2023/03/18/tech/tiktok-ban-explainer/index.html
https://www.mirror.co.uk/news/uk-news/tiktok-star-30-dies-suddenly-29495850
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